Foto de João Moreira dos Santos
Sines recebeu mais uma vez as músicas do mundo, essa expressão artística pioneira da globalização e do entendimento dos povos, pois que a sua compreensão é universal, como aliás ficou demonstrado neste evento: mais do que os idiomas (incompreensíveis) imperaram os sentimentos e as notas musicais.
Esta é, porém, uma globalização pacífica e sem outro fim que não seja a aproximação de culturas e o seu entendimento, o que em última instância leva à sua compreensão e a reduzir a xenofobia e o ostracismo.
Dada a extensão do programa deste Festival de Músicas do Mundo (FMM) - com 24 concertos repartidos por Porto Covo, pela Avenida da Praia e pelo Castelo, aos quais assistiram cerca de 50 mil espectadores - só nos foi possível assistir aos concertos realizados no castelo de Sines nos dias 28 e 29 de Julho.
Comecemos pelo concerto que verdadeiramente nos levou ao FMM e que acabou, como já esperávamos, por ser o mais interessante: Trilok Gurtu.
Foto de João Moreira dos Santos
Eleito cinco vezes o melhor percussionista pela revista Downbeat, nasceu em Bombaím, na Índia, em 1951, numa família de músicos. Estudou tablas desde os seis anos, mas cedo começou a interessar-se pela música ocidental, emigrando em 1973 para os EUA e depois para a Europa. Aqui viria a colaborar com músicos como Pat Metheny, Jan Garbarek, Nitin Sawhney, Charlie Mariano e John Tchicai, Don Cherry, Philip Catherine, Joe Zawinul, Andy Summers e Larry Coryell.
Este ano, Gurtu trouxe a Sines a "tradição acústica indiana", fazendo-se acompanhar por dois dos seus maiores cantores, Rajan e Sajan Misra, mestres do khylal, um canto virtuoso ornamentado e aberto à improvisação.
Foto de João Moreira dos Santos
Foi a este concerto que tivemos oportunidade de assistir, o qual não nos desiludiu, bem pelo contrário, muito embora o seu formato (com as vozes), não tenha permitido explorar todo o potencial de Gurtu. ainda assim ficou bem claro o seu dom especial para a percussão e a sua capacidade de dar à música a batida e o complemento rítmico necessário em cada momento, seguindo os solistas e as vozes com inteligência e intuição.
Foto de João Moreira dos Santos
Antes de Gurtu actuara um grupo também muito forte, proveniente do Iraque: Farida & Iraqi Maqam Ensemble.
Este grupo é liderado por Farida Muhammad, apresentada pela organização do FMM como uma das "mais carismáticas e impressionantes intérpretes femininas no circuito da world music", a "voz da Mesopotâmia".
Foto de João Moreira dos Santos
Deste conjunto nada sabíamos, pois não existe qualquer ligação com o jazz, ao contrário do que sucede com Trilok Gurtu, porém muito nos surpreendeu. De facto, Farida tem uma excelente voz, uma boa presença em palco e uma notável sensibilidade musical e artística. Para o sucesso do concerto muito contarm também os músicos, com especial destaque para Karim Darwish (nas Tablas), um virtuoso deste instrumento.
Foto de João Moreira dos Santos
Nesta mesma noite subiu ainda ao palco o grupo The Bad Plus, que muita tinta tem feito correr, com os seus admiradores e detractores, formado por Ethan Iverson (piano), Reid Anderson (contrabaixo) e David King (bateria).
Grupo influenciado pela pop-rock, o seu jazz (se assim se lhe pode chamar em rigor...) vai por vezes beber ao cancioneiro de grupos como os Nirvana, Black Sabbath, Blondie ou Aphex Twin, e no concerto de Sines coube mesmo uma versão de "Chariots of Fire", de Vangelis...
Foto de João Moreira dos Santos
Batida forte e volume elevado, os três músicos deste "power trio" dos EUA agradaram à audiência mas não nos encantaram por aí além porque simplesmente não trazem nada que acrescente algo de verdadeiro valor ao jazz a não ser, eventualmente, a angariação de novos públicos, embora estes entrem por uma porta um tanto equívoca...
A batida é demasiado rock, o piano já viu melhores dias nas mãos de outros pianistas e o contrabaixista não provou ser mais do que mediano.
Foto de João Moreira dos Santos
Na segunda noite do FMM a que tivemos ooprtunidade de assistir (que na realidade era a terceira e última), ocasião para presenciar dois projectos bem distintos.
O primeiro deles é oriundo do Brasil e dá pelo nome de Cordel do Fogo Encantado, um jovem quinteto pernambucano apresentado pela organização do Festival como "A força da mitologia sertaneja trazida para o século XXI".
A música deste projecto vai beber a sua inspiração ao imaginário rural do Nordeste, tendo começado como um espectáculo teatral, resultando num espectáculo bastante cénico, quase circense, por vezes, animado pelo poeta e vocalista "psicadélico" Lirinha.
Só é pena que ao vivo a música deste quinteto se aproxime tanto do rock (heavy metal?), perdendo o encanto acústico patente no disco disponibilizado pela organização do FMM, onde nos pareceu bem mais interesante.
Foto de João Moreira dos Santos
O segundo concerto a que assistimos, uma vez que saltámos por cima de um grupo de cantoras da Finlândia, foi o de Seun Kuti & Egypt 80, grupo liderado pelo filho mais novo de Fela Kuti, "a figura régia do afrobeat".
Esperávamos mais deste projecto e não nos agradou especialmente a fusão com a música ocidental, com a inclusão de bateria e baixo eléctrico, embora seja precisamente por esta fusão que Fela Kuti ficou famoso...