Roberta Gambarini: “Amo a melancolia da música tradicional portuguesa ”
Roberta Gambarini é considerada uma das melhores e mais promissoras e talentosas vozes do Jazz. Antecipando a sua estreia no AngraJazz, no próximo dia 4 de Outubro, JNPDI! entrevistou-a e ficou a conhecer a sua paixão pela nostalgia do fado e da música portuguesa, onde elege como intérpretes favoritos Amália, Dulce Pontes, Mariza e Cristina Branco.
JNPDI: O jazz era popular em Itália quando nasceu ou o seu interesse por esta música deveu-se apenas à influência dos seus pais?
Roberta Gambarini: O motivo do meu interesse tão precoce pelo jazz deveu-se ao facto dos meus pais serem ambos apreciadores de longa data desta música. O meu pai tocou saxofone-tenor quando era jovem e embora não tenha seguido uma carreira manteve-se um grande apreciador de jazz.
Os meus pais começaram a levar-me a concertos do jazz desde criança. Por outro lado, houve sempre um circuito de concertos de jazz em Itália e no início dos anos 80 havia um circuito do clubes de jazz no Norte da Itália onde se podiam ver muitos grandes músicos em espaços pequenos e, assim, juntamente com os concertos em grandes teatros, por [Count] Basie, Sarah [Vaughan], Ella [Fitzgerald] e outros, comecei a ouvir [Dexter] Gordon, Harry Edison, Zoot Sims, Eddie Lockjaw Davis e muito mais em pequenos clubes. Isso era fantástico.
JNPDI: Até que ponto cantaria de forma diferente se tivesse nascido noutro país que não Itália? O que incorporou da rica cultura musical italiana?
RG: Bem, certamente seria uma pessoa diferente se a minha vida tivesse sido diferente… Canto o que sinto e quem sou e a minha história é parte de quem sou. Quanto às influências culturais no meu trabalho não penso muito nisso porque são inatas. Canto o que sinto e não me auto-analiso muito. Posso dizer que há um grande repertório de canções de compositores italianos que não são muito conhecidos e que podem ser adaptados ao meu repertório. Vou incluir esses compositores, assim como mais repertório cubano, brasileiro e espanhol no meu próximo projecto com o clarinetista cubano Paquito D'Rivera, que conta, entre outros músicos envolvidos, com o harpista colombiano Edmar Castaneda.
JNPDI: Tal como outras grandes cantoras começou por aprender um instrumento. O que é menos comum é que tenha escolhido o clarinete e não o piano, por exemplo… Houve alguma razão especial para essa escolha? Ainda toca?
RG: Não, o que eu realmente queria tocar era piano. Tive oportunidade de alugar o meu primeiro piano aos 18 anos, quando me mudei para Milão, e tenho estudado desde então. Quando era criança não tínhamos espaço para um piano no nosso apartamento, daí o clarinete… mas desisti alguns anos mais tarde para dedicar-me a tempo integral a cantar.
JNPDI!: Entre a sua ida para Nova Iorque e a nomeação, pela Jazz Journalists Association, como melhor vocalista de 2007 passou um curto período de 10 anos. Que marcos destaca entre estes dois momentos decisivos?
RG: O primeiro é o meu encontro com o grande Benny Carter, a quem devo muito e que permanecerá a minha maior influência como músico e como ser humano. Ele convidou o Larry Clothier (que tinha sido manager de Carnmen McRae) a contratar-me depois do Clothier lhe ter mostrado uma demo que tinha ouvido no estúdio de um editor de música em Nova Iorque. O Benny honrou-me com a sua amizade e organizou inclusivamente a minha primeira actuação em Los Angeles para que eu pudesse ser introduzida à cena local do jazz. Ser-lhe-ei eternamente grata e sentirei sempre a sua falta.
A outra principal influência e relação foi com o grande James Moody, que me ajudou e me ensinou muito. Conheci o Moody num festival na Cidade do Cabo, na África do Sul, e trabalhei muito com ele. O James Moody tornou-se a minha inspiração musical e, junto com sua esposa Linda, a minha segunda família.
O encontro com Hank Jones foi outro marco e a colaboração com esta lenda inspira-me constantemente.
JNPDI!: Um crítico de jazz disse recentemente que a Roberta é uma verdadeira sucessora de Ella Fitzgerald, Sarah Vaughan e Carmen McRae. Sente estas palavras mais como um elogio ou como uma pesada responsabilidade?
RG: Naturalmente é uma honra ser comparada aos meus ídolos. Mais do que um peso nos meus ombros, encaro-o como uma herança maravilhosa de arte e amor e sinto-me honrada por ter a oportunidade de levar esta música às pessoas de vários pontos do mundo. Se não fossem os grandes nome que mencionou eu não existiria.
JNPDI!: Quem admira mais entre as cantoras de jazz?
RG: Os meus ídolos de infância eram Ella Fitzgerald e Louis Armstrong, mas ouvi tudo e todos. As minhas influências seriam demasiadas para as poder enunciar. Presentemente a minha favorita é a cantora brasileira de jazz Leni Andrade.
JNPDI!: Teve o privilégio de cantar com músicos como Michael Brecker, Ron Carter, Herbie Hancock, Slide Hampton, Roy Hargrove, Jimmy Heath, Hank Jones, Christian McBride e Toots Thielemans. Que aprendeu com eles?
RG: Aprendi que tem que se trabalhar no sentido de se tocar a próxima nota melhor do que se tocou a anterior. Aprendi também que a música é vasta e que é preciso ter o coração e os ouvidos abertos. Um grande exemplo desta atitude era o Michael Brecker; ele tinha uma forma especial de fazer com que todos se sentissem especiais e ouvia tudo sem preconceitos. Mas todos os músicos que mencionou têm este dom.
JNPDI!: Como surgiu a oportunidade de gravar com Hank Jones?
RG: Estava a actuar num pequeno clube em Nova Iorque, o Jazz Gallery, com o Ronnie Matthews, Jimmy Cobb e o grande Walter Booker e tinha começado a cantar quando de repente vi o Lionel Hampton a entrar (estava já numa cadeira de rodas, mas ainda a tocar). Tive quase um ataque cardíaco! O Lionel Hampton tinha ouvido falar no meu concerto através de Larry Clothier (o meu gerente) e dos outros músicos e veio assistir. No fim da noite convidou-me para tocar no seu festival em Moscow, no Idaho. Nesse ano o Hank Jones fazia parte da secção rítmica, o que era fantástico. Conheci-o e ele foi maravilhoso comigo. Tocámos outra vez no Festival de Jazz do Mar do Norte, em 2002, com Niels Hennings Orsted Pedersen e Alvin Queen, e desde então fizemos muitos projectos em conjunto, incluindo uma digressão pela Europa comigo como convidada do trio de Hank (com George Mraz e Willie Jones 3rd), e naturalmente a gravação do duo e dos concertos. Recentemente tocámos em Tanglewood e no Duke Ellington Jazz Festival, em Washington D.C.
JNPDI!: Quão difícil foi realizar Easy to Love, o seu novo CD?
RG: Não foi de todo difícil!! Foi uma festa. Fizemo-lo em duas tardes, em quatro horas no primeiro dia e em três no segundo. Todos os músicos envolvidos são amigos queridos e decidimo-nos a gravar as canções num contexto ao vivo (a maioria das faixas resulta de primeiros, e às vezes únicos, takes e não há qualquer overdubbing). Divertimo-nos muito. O [James] Moody juntou-se a nós em dois temas e foi fantástico como sempre.
JNPDI! O que pode o público do AngraJazz esperar do seu concerto, considerando que esta é a sua muito primeira actuação em Portugal?
RG: As audiências dos países mediterrânicos são muito calorosas e sensíveis e adoram melodias. Eu sou uma cantora que gosta de cantar melodias, é assim que me vejo, por isso espero realmente que nos conectemos num nível profundo. Amo o sentido de melancolia da música tradicional portuguesa e a musicalidade da língua e espero que as audiências portuguesas gostem do meu canto.
JNPDI! O que conhece da música portuguesa e dos seus intérpretes?
RG: Quando era criança via frequentemente a Amália Rodrigues a cantar na televisão italiana e adorava. Segui também o sucesso do grupo Madredeus, que tinha uma bela cantora. Adoro a Dulce Pontes e tenho mesmo alguns CDs dela e um DVD maravilhoso que fez com compositor italiano, o Ennio Morricone, que gosto de rever periodicamente. A Mariza é também extraordinária. No Festival de Jazz do Mar do Norte, em 2005, encontrei-me com Cristina Branco, que tem uma voz bonita. Há igualmente alguns músicos maravilhosos de jazz e cantores que conheci através do MySpace. Alguns deles adaptaram letras portuguesas na composição do jazz e penso que é muito belo.
Roberta Gambarini é considerada uma das melhores e mais promissoras e talentosas vozes do Jazz. Antecipando a sua estreia no AngraJazz, no próximo dia 4 de Outubro, JNPDI! entrevistou-a e ficou a conhecer a sua paixão pela nostalgia do fado e da música portuguesa, onde elege como intérpretes favoritos Amália, Dulce Pontes, Mariza e Cristina Branco.
JNPDI: O jazz era popular em Itália quando nasceu ou o seu interesse por esta música deveu-se apenas à influência dos seus pais?
Roberta Gambarini: O motivo do meu interesse tão precoce pelo jazz deveu-se ao facto dos meus pais serem ambos apreciadores de longa data desta música. O meu pai tocou saxofone-tenor quando era jovem e embora não tenha seguido uma carreira manteve-se um grande apreciador de jazz.
Os meus pais começaram a levar-me a concertos do jazz desde criança. Por outro lado, houve sempre um circuito de concertos de jazz em Itália e no início dos anos 80 havia um circuito do clubes de jazz no Norte da Itália onde se podiam ver muitos grandes músicos em espaços pequenos e, assim, juntamente com os concertos em grandes teatros, por [Count] Basie, Sarah [Vaughan], Ella [Fitzgerald] e outros, comecei a ouvir [Dexter] Gordon, Harry Edison, Zoot Sims, Eddie Lockjaw Davis e muito mais em pequenos clubes. Isso era fantástico.
JNPDI: Até que ponto cantaria de forma diferente se tivesse nascido noutro país que não Itália? O que incorporou da rica cultura musical italiana?
RG: Bem, certamente seria uma pessoa diferente se a minha vida tivesse sido diferente… Canto o que sinto e quem sou e a minha história é parte de quem sou. Quanto às influências culturais no meu trabalho não penso muito nisso porque são inatas. Canto o que sinto e não me auto-analiso muito. Posso dizer que há um grande repertório de canções de compositores italianos que não são muito conhecidos e que podem ser adaptados ao meu repertório. Vou incluir esses compositores, assim como mais repertório cubano, brasileiro e espanhol no meu próximo projecto com o clarinetista cubano Paquito D'Rivera, que conta, entre outros músicos envolvidos, com o harpista colombiano Edmar Castaneda.
JNPDI: Tal como outras grandes cantoras começou por aprender um instrumento. O que é menos comum é que tenha escolhido o clarinete e não o piano, por exemplo… Houve alguma razão especial para essa escolha? Ainda toca?
RG: Não, o que eu realmente queria tocar era piano. Tive oportunidade de alugar o meu primeiro piano aos 18 anos, quando me mudei para Milão, e tenho estudado desde então. Quando era criança não tínhamos espaço para um piano no nosso apartamento, daí o clarinete… mas desisti alguns anos mais tarde para dedicar-me a tempo integral a cantar.
JNPDI!: Entre a sua ida para Nova Iorque e a nomeação, pela Jazz Journalists Association, como melhor vocalista de 2007 passou um curto período de 10 anos. Que marcos destaca entre estes dois momentos decisivos?
RG: O primeiro é o meu encontro com o grande Benny Carter, a quem devo muito e que permanecerá a minha maior influência como músico e como ser humano. Ele convidou o Larry Clothier (que tinha sido manager de Carnmen McRae) a contratar-me depois do Clothier lhe ter mostrado uma demo que tinha ouvido no estúdio de um editor de música em Nova Iorque. O Benny honrou-me com a sua amizade e organizou inclusivamente a minha primeira actuação em Los Angeles para que eu pudesse ser introduzida à cena local do jazz. Ser-lhe-ei eternamente grata e sentirei sempre a sua falta.
A outra principal influência e relação foi com o grande James Moody, que me ajudou e me ensinou muito. Conheci o Moody num festival na Cidade do Cabo, na África do Sul, e trabalhei muito com ele. O James Moody tornou-se a minha inspiração musical e, junto com sua esposa Linda, a minha segunda família.
O encontro com Hank Jones foi outro marco e a colaboração com esta lenda inspira-me constantemente.
JNPDI!: Um crítico de jazz disse recentemente que a Roberta é uma verdadeira sucessora de Ella Fitzgerald, Sarah Vaughan e Carmen McRae. Sente estas palavras mais como um elogio ou como uma pesada responsabilidade?
RG: Naturalmente é uma honra ser comparada aos meus ídolos. Mais do que um peso nos meus ombros, encaro-o como uma herança maravilhosa de arte e amor e sinto-me honrada por ter a oportunidade de levar esta música às pessoas de vários pontos do mundo. Se não fossem os grandes nome que mencionou eu não existiria.
JNPDI!: Quem admira mais entre as cantoras de jazz?
RG: Os meus ídolos de infância eram Ella Fitzgerald e Louis Armstrong, mas ouvi tudo e todos. As minhas influências seriam demasiadas para as poder enunciar. Presentemente a minha favorita é a cantora brasileira de jazz Leni Andrade.
JNPDI!: Teve o privilégio de cantar com músicos como Michael Brecker, Ron Carter, Herbie Hancock, Slide Hampton, Roy Hargrove, Jimmy Heath, Hank Jones, Christian McBride e Toots Thielemans. Que aprendeu com eles?
RG: Aprendi que tem que se trabalhar no sentido de se tocar a próxima nota melhor do que se tocou a anterior. Aprendi também que a música é vasta e que é preciso ter o coração e os ouvidos abertos. Um grande exemplo desta atitude era o Michael Brecker; ele tinha uma forma especial de fazer com que todos se sentissem especiais e ouvia tudo sem preconceitos. Mas todos os músicos que mencionou têm este dom.
JNPDI!: Como surgiu a oportunidade de gravar com Hank Jones?
RG: Estava a actuar num pequeno clube em Nova Iorque, o Jazz Gallery, com o Ronnie Matthews, Jimmy Cobb e o grande Walter Booker e tinha começado a cantar quando de repente vi o Lionel Hampton a entrar (estava já numa cadeira de rodas, mas ainda a tocar). Tive quase um ataque cardíaco! O Lionel Hampton tinha ouvido falar no meu concerto através de Larry Clothier (o meu gerente) e dos outros músicos e veio assistir. No fim da noite convidou-me para tocar no seu festival em Moscow, no Idaho. Nesse ano o Hank Jones fazia parte da secção rítmica, o que era fantástico. Conheci-o e ele foi maravilhoso comigo. Tocámos outra vez no Festival de Jazz do Mar do Norte, em 2002, com Niels Hennings Orsted Pedersen e Alvin Queen, e desde então fizemos muitos projectos em conjunto, incluindo uma digressão pela Europa comigo como convidada do trio de Hank (com George Mraz e Willie Jones 3rd), e naturalmente a gravação do duo e dos concertos. Recentemente tocámos em Tanglewood e no Duke Ellington Jazz Festival, em Washington D.C.
JNPDI!: Quão difícil foi realizar Easy to Love, o seu novo CD?
RG: Não foi de todo difícil!! Foi uma festa. Fizemo-lo em duas tardes, em quatro horas no primeiro dia e em três no segundo. Todos os músicos envolvidos são amigos queridos e decidimo-nos a gravar as canções num contexto ao vivo (a maioria das faixas resulta de primeiros, e às vezes únicos, takes e não há qualquer overdubbing). Divertimo-nos muito. O [James] Moody juntou-se a nós em dois temas e foi fantástico como sempre.
JNPDI! O que pode o público do AngraJazz esperar do seu concerto, considerando que esta é a sua muito primeira actuação em Portugal?
RG: As audiências dos países mediterrânicos são muito calorosas e sensíveis e adoram melodias. Eu sou uma cantora que gosta de cantar melodias, é assim que me vejo, por isso espero realmente que nos conectemos num nível profundo. Amo o sentido de melancolia da música tradicional portuguesa e a musicalidade da língua e espero que as audiências portuguesas gostem do meu canto.
JNPDI! O que conhece da música portuguesa e dos seus intérpretes?
RG: Quando era criança via frequentemente a Amália Rodrigues a cantar na televisão italiana e adorava. Segui também o sucesso do grupo Madredeus, que tinha uma bela cantora. Adoro a Dulce Pontes e tenho mesmo alguns CDs dela e um DVD maravilhoso que fez com compositor italiano, o Ennio Morricone, que gosto de rever periodicamente. A Mariza é também extraordinária. No Festival de Jazz do Mar do Norte, em 2005, encontrei-me com Cristina Branco, que tem uma voz bonita. Há igualmente alguns músicos maravilhosos de jazz e cantores que conheci através do MySpace. Alguns deles adaptaram letras portuguesas na composição do jazz e penso que é muito belo.
JNPDI! Disse numa entrevista ao site AllAboutJazz que gostaria de participar como actriz num filme de Pedro Almodovar. Há algum desenvolvimento nesse sentido?
RG: Ainda não. Estou a trabalhar nisso…
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