9 de março de 2004

Os problemas do Jazz em Portugal - Parte I: Os Festivais

Há muitos. Ainda bem; o público agradece.

São muitos mas pequenos. Pois é, nem tudo é perfeito. País pequeno, mentalidade menor, financiamentos mínimos. Vai tudo dar ao mesmo.

São financiados pelo $ público. Pois são, e bem. Jazz é Cultura e cultura é desenvolvimento. 10 estádios do Euro 2004 também foram financiados pelo $ público para neles se jogar 2 vezes por mês; não é investimento, é desperdício, praticamente um crime. Não, de facto, um crime mesmo! Em Portugal há crimes financiados pelo Estado, é esta a triste conclusão a que chego ao escrever um inocente texto sobre jazz... Trocando por miúdos: um cidadão espera 12 horas para ser atendido na urgência de um hospital: não interessa, não tem swing e só é notícia na TVI, isto se o doente tiver duas cabeças ou tiver esfaqueado o médico. Já o presidente dos pinguins da avenida Futebol Club dá uma conferência de imprensa para anunciar que nada tem a dizer sobre o degelo da terra porque o seu clube ganha com gelo ou sem gelo: acontecimento nacional, câmaras de tv em directo, o Primeiro-Ministro lamenta não poder estar presente por ter ficado entalado numa porta, o Presidente da República está retido em Belém a escrever o 50.º livro de discursos mas envia cumprimentos, a Ministra das Finanças pondera um perdão fiscal para compensar os clubes afectados pelo degelo mas está-se nas tintas para Quioto (confundiu com Quitoso). Resultado: Futebol 1 - Desenvolvimento 0. A Cultura (essa galdéria), e o Jazz (esse batuque) foram expulsos pelo árbitro logo no início, acusados de obstruir a fluidez do jogo. Cartão vermelho directo. «Boa, boa! Quem não dá votos não tem devotos», sussurram ressabiadamente 5 cágados que, à falta de melhor que fazer, Parlamentam enquanto vêem o jogo nos televisores do hemiciclo. «O povo quer é futebol e betão, eheheheh»... «Venham a nós, Senhor, os votos de tantos devotos desta religião nacional que nós, com tanto sacrifício pessoal, ajudamos a pregar a bem da coesão e da auto-estima dos portugueses», acrescenta um deles sorrindo cinicamente enquanto simula ajoelhar-se perante uma imagem religiosa.

Estão descentralizados. Que bom, Portugal já não é só Lisboa.

São profissionais. O tempo dos amadores já passou (embora ameace voltar).

São sazonais. Tudo bem, assim dá para ouvir jazz quase todo o ano e em quase todas as estações.

Têm público. SIM!

Não comunicam. Portugal é um país de quintas e hortas... Para quê partilhar o conhecimento? Por que hão-de dialogar os vários produtores de festivais que decorrem em simultâneo para que possam partilhar músicos e os respectivos custos de viagem até Portugal?

Sobrepôem-se. Não havia necessidade... com 12 meses num ano e muitas mais semanas. É mais uma vez a falta de diálogo e de concertação de interesses em benefício do público que ora não tem jazz, ora tem 2 concertos no mesmo dia em diferentes locais e festivais/concertos.

Não deixam obra. É verdade, terminado o festival 9's fora nada a não ser o prazer da audição, que já é muito! Mas a verdade é que uma % do investimento dos festivais devia ir para a formação de músicos portugueses. Mas, onde estão eles que raramente aparecem nos workshops que em alguns festivais se têm promovido com alguns dos gigantes do jazz? Já sabem tudo? Então onde estão o Miles Davis e o John Coltrane portugueses? Apresentem-mos e, mea culpa, aqui confessarei a tremenda injustiça das minhas palavras.

Têm pouca divulgação na imprensa. Pois têm e terão sempre enquanto, felizmente, a música prevalecer face ao espectáculo e aos escândalos de outras músicas mais mediáticas. Por outro lado, a sobreposição de Festivais faz com que os poucos críticos se dividam, se dispersem e alguns dos festivais fiquem na sombra. E assim se perde espaço e tempo para o jazz nos nossos media...

Não têm marketing. Pois não, ainda estão muitos deles na lógica da produção. So what? A maioria das empresas idem idem " ". Pois é, mas essas dividem-se em duas categorias: as que já faliram e as que estão à beira da falência.

Resumindo e não concluindo, muito há fazer nos festivais de jazz em Portugal mas não deixa de ser verdade que o mais difícil já foi feito por pessoas como Luís Villas-Boas, Duarte Mendonca, Paulo Gil, José Duarte ou António Ferro, só para nomear alguns dos mais importantes produtores e promotores.


Site Meter Powered by Blogger