Lisbon Jazz Summer School: Raízes profundas para um futuro frutuoso
A convite do CCB, JNPDI acompanhou durante um dia a Lisbon Jazz Summer School 2010, iniciativa que vai na sua terceira edição e que visa contribuir para a qualificação dos músicos de jazz (e não só) portugueses.
Curiosamente, esta visita coincidiu com a celebração do 20.º aniversário dos Cursos Projazz, evento que em 23 de Julho de 1990 inaugurou em Portugal o ensino do Jazz por músicos estrangeiros de topo, que durante uma semana fixam residência entre nós.
Foi precisamente esta tradição que a LJSS retomou em 2008, organizando-se em duas iniciativas distintas: o Jazz Summer Course (destinado a músicos de nível médio e avançado) e o Férias com Jazz (para músicos iniciados ou de nível básico). O primeiro curso é sempre dirigido por um músico estrangeiro convidado para o efeito e este ano a organização seleccionou o pianista Danilo Perez – músico que toca, por exemplo, com Wayne Shorter, expoente do jazz – que se fez acompanhar de quatro professores que são também os membros do seu quinteto. Já o segundo, é sempre coordenado por um músico nacional: o trompetista Gonçalo Marques.
Este ano inscreveram-se ao todo cerca de 20 alunos no Jazz Summer Course e, o que é impressionante e demonstra a vitalidade do Jazz, nada menos do que 40 na iniciativa Férias com Jazz. Impressionou-nos, aliás, a afluência dos mais jovens, entre os 12 e os 15 anos. Eles são não só a prova de que o Jazz está vivo, mas também que é cada vez mais uma linguagem da juventude. Daqui a uns anos, quando a LJSS tiver produzido os frutos das suas raízes, o Jazz estará certamente enriquecido, diversificado e, o que é muito importante, menos sujeito ao preconceito dos músicos ditos clássicos ou eruditos pois muitos destes jovens estudantes são precisamente oriundos desse meio musical.
A fórmula de sucesso da LJSS
Primeiro que tudo, a opção por Danilo Perez verificou-se totalmente acertada. O pianista e compositor é também um comunicador nato e, sobretudo, um talentoso pedagogo cujas lições funcionam tanto com os mais jovens como com os mais velhos.
Não é tanto a formalidade que ensina nas suas masterclasses, mas o exemplo e a expressão e vivência do que partilha. Ali não há julgamento nem criticismo demolidor – como vimos noutros cursos similares dados por norte-americanos – pois o que importa é motivar o aluno e não “castigá-lo” por ter decidido aprender uma linguagem musical e não a dominar ainda suficientemente bem.
Na aula final, aberta aos músicos e alunos que não se inscreveram na LJSS, Danilo incentiva, elogia, sugere, mimetiza, envolve-se, toca, explica, ensina, caricatura, fala, dialoga, dança, canta, caminha. Tudo serve para ensinar o idioma do Jazz na terra do Fado.
Júlio Resende (pianista), voluntaria-se para improvisar com Daniel Vieira (saxofone), João Hasselberg (contrabaixo) e Joel Silva (bateria). Danilo ouve atentamente com os restantes membros da sua banda e depois intervém e usa todos os recursos para comunicar com Resende: o cocktail pedagógico que usa, empenhadamente, para passar a sua mensagem inclui dicas, mas também festas na sua cabeça e a intervenção no piano em simultâneo com o pianista nacional. No fim, está convencido e confidencia a Resende a sua excepcional qualidade de jazzista. O mesmo tinha já sucedido, por exemplo, nas aulas de combo com Ricardo Toscano, um jovem de 16 anos que está a causar muita expectativa no meio do jazz nacional.
Outra componente da fórmula de sucesso da LJSS são as aulas de improvisação livre (uma aposta inovadora que a LJSS garante ser um exclusivo do seu programa) de Gádor Soriano, cantora e docente espanhola que já vai no seu terceiro ano a participar nesta iniciativa em que também se responsabiliza pelas aulas de canto. O objectivo, aparentemente bem conseguido, é fazer com que os mais novos (dos 12 aos 15 anos) se evadam por momentos da rigidez da aprendizagem musical e possam explorar o seu instrumento livremente. Gádor conduz através de sinais e gestos previamente comunicados aos alunos. Na LJSS respira-se liberdade e criatividade sem se perder o norte: ensinar jazz.
Mas os mais novos não se ficam por aqui: têm também de participar numa orquestra dirigida por Claus Nymark e que sobre ao palco no último dia da LJSS.
Também importantes, são as aulas de combos (em que os alunos tocam em conjunto) e as aulas individuais de instrumento. Ambas preparam para os concertos finais no Pequeno Auditório do CCB, com os quais a LJSS encerra todos os anos a sua actividade.
E, claro, as Masterclasses. A que tivemos oportunidade de acompanhar revelou-se muito interessante pois o saxofonista indiano Rudresh Mahanthappa partilhou com a audiência as músicas que mudaram a sua vida, alargando os seus horizontes ao trazer à LJSS a cultura musical indiana.
Last but not least, há ainda mais três componentes de sucesso que marcam a LJSS. A primeira é a organização e divulgação que João Godinho e Alexandra Ávila lhe imprimiram desde o início, eles que são de facto os seus ideólogos.
A segunda são as jam-sessions que têm lugar todas as noites e que misturam os alunos de ambos os cursos e os próprios professores, que não se fazem rogados em tocar sequer com músicos iniciados ou de nível intermédio.
A terceira é a informalidade que reina na LJSS, essencial para garantir o diálogo entre quem aprende e quem ensina.
Porquê o CCB?
Talvez se pergunte por que razão é o CCB, e não a Escola Superior de Música, a apostar na formação… A verdade é que faz todo o sentido este envolvimento pois é interessante e importante (muito) ver uma sala de espectáculos a trabalhar a montante, isto é, a contribuir para a formação daqueles que virão um dia a ser os seus fornecedores (os músicos) e também os seus clientes (os muitos jovens que além de músicos serão também público). Este é um dos grandes méritos da LJSS e talvez, porém, o que passa mais invisível ao imediatismo que oferece o propósito mais explícito da formação em si.
Quem durante anos criticou o Estado e as suas instituições por só fomentar a oferta e não a procura tem aqui na LJSS um exemplo de uma excepção que urge democratizar pelo país e que importa alargar ainda mais também ao público em geral.
Caminhos para o futuro...
No futuro é crucial envolver também melómanos e apreciadores de Jazz em particular - assim como os muitos que desconhecem o Jazz e a sua magia e que assim poderiam entrar nele - para os quais a LJSS pode, e deve, igualmente criar programas. É sabido que o maior inimigo de algo é o preconceito e a ignorância, dois obstáculos que poderão desta forma ser combatidos. Far-se-ia, assim, a triangulação “perfeita” ao formarem-se músicos, estudantes de música e público.
Esses programas podem incluir aulas de história do jazz no mundo e em Portugal pois um músico não pode apenas saber o idioma, tem também de conhecer a sua idiossincrasia e contexto cultural, político e social. E no caso concreto do jazz, é importante que ele não seja ensinado sem que quem o aprende perceba o que ele representou para um povo que em pleno século XX ainda vivia segregado, discriminado e relegado aos trabalhos manuais. Retirar-lhe esta informação e dimensão é fazer do Jazz apenas um género musical, o que o empobrece sobremaneira.
Finalmente, tais programas podem também incluir vertentes que só recentemente foram introduzidas em Portugal quando em Junho do corrente ano a Associação Grémio das Músicas e a Universidade do Algarve promoveram uma master class sobre comunicação e marketing para bandas. São estas competências que o carácter inovador da LJSS precisa agora acrescentar ao seu programa, no que pode ser pioneira a nível internacional…
No demais, no ensino da música, a LJSS atingiu uma excelência que os músicos, melhor do que ninguém, atestam. Ricardo Toscano, por exemplo, afirmou-nos em entrevista o seguinte:
"Foi uma oportunidade única e fantástica poder conviver e trabalhar com pessoas e músicos daquele nível e deram-nos tanta informação e tantas maneiras de a usar... Foi de longe o melhor workshop em que algumas vez participei. Foi uma grande experiência de vida".
A convite do CCB, JNPDI acompanhou durante um dia a Lisbon Jazz Summer School 2010, iniciativa que vai na sua terceira edição e que visa contribuir para a qualificação dos músicos de jazz (e não só) portugueses.
Curiosamente, esta visita coincidiu com a celebração do 20.º aniversário dos Cursos Projazz, evento que em 23 de Julho de 1990 inaugurou em Portugal o ensino do Jazz por músicos estrangeiros de topo, que durante uma semana fixam residência entre nós.
Foi precisamente esta tradição que a LJSS retomou em 2008, organizando-se em duas iniciativas distintas: o Jazz Summer Course (destinado a músicos de nível médio e avançado) e o Férias com Jazz (para músicos iniciados ou de nível básico). O primeiro curso é sempre dirigido por um músico estrangeiro convidado para o efeito e este ano a organização seleccionou o pianista Danilo Perez – músico que toca, por exemplo, com Wayne Shorter, expoente do jazz – que se fez acompanhar de quatro professores que são também os membros do seu quinteto. Já o segundo, é sempre coordenado por um músico nacional: o trompetista Gonçalo Marques.
Este ano inscreveram-se ao todo cerca de 20 alunos no Jazz Summer Course e, o que é impressionante e demonstra a vitalidade do Jazz, nada menos do que 40 na iniciativa Férias com Jazz. Impressionou-nos, aliás, a afluência dos mais jovens, entre os 12 e os 15 anos. Eles são não só a prova de que o Jazz está vivo, mas também que é cada vez mais uma linguagem da juventude. Daqui a uns anos, quando a LJSS tiver produzido os frutos das suas raízes, o Jazz estará certamente enriquecido, diversificado e, o que é muito importante, menos sujeito ao preconceito dos músicos ditos clássicos ou eruditos pois muitos destes jovens estudantes são precisamente oriundos desse meio musical.
A fórmula de sucesso da LJSS
Primeiro que tudo, a opção por Danilo Perez verificou-se totalmente acertada. O pianista e compositor é também um comunicador nato e, sobretudo, um talentoso pedagogo cujas lições funcionam tanto com os mais jovens como com os mais velhos.
Não é tanto a formalidade que ensina nas suas masterclasses, mas o exemplo e a expressão e vivência do que partilha. Ali não há julgamento nem criticismo demolidor – como vimos noutros cursos similares dados por norte-americanos – pois o que importa é motivar o aluno e não “castigá-lo” por ter decidido aprender uma linguagem musical e não a dominar ainda suficientemente bem.
Na aula final, aberta aos músicos e alunos que não se inscreveram na LJSS, Danilo incentiva, elogia, sugere, mimetiza, envolve-se, toca, explica, ensina, caricatura, fala, dialoga, dança, canta, caminha. Tudo serve para ensinar o idioma do Jazz na terra do Fado.
Júlio Resende (pianista), voluntaria-se para improvisar com Daniel Vieira (saxofone), João Hasselberg (contrabaixo) e Joel Silva (bateria). Danilo ouve atentamente com os restantes membros da sua banda e depois intervém e usa todos os recursos para comunicar com Resende: o cocktail pedagógico que usa, empenhadamente, para passar a sua mensagem inclui dicas, mas também festas na sua cabeça e a intervenção no piano em simultâneo com o pianista nacional. No fim, está convencido e confidencia a Resende a sua excepcional qualidade de jazzista. O mesmo tinha já sucedido, por exemplo, nas aulas de combo com Ricardo Toscano, um jovem de 16 anos que está a causar muita expectativa no meio do jazz nacional.
Outra componente da fórmula de sucesso da LJSS são as aulas de improvisação livre (uma aposta inovadora que a LJSS garante ser um exclusivo do seu programa) de Gádor Soriano, cantora e docente espanhola que já vai no seu terceiro ano a participar nesta iniciativa em que também se responsabiliza pelas aulas de canto. O objectivo, aparentemente bem conseguido, é fazer com que os mais novos (dos 12 aos 15 anos) se evadam por momentos da rigidez da aprendizagem musical e possam explorar o seu instrumento livremente. Gádor conduz através de sinais e gestos previamente comunicados aos alunos. Na LJSS respira-se liberdade e criatividade sem se perder o norte: ensinar jazz.
Mas os mais novos não se ficam por aqui: têm também de participar numa orquestra dirigida por Claus Nymark e que sobre ao palco no último dia da LJSS.
Também importantes, são as aulas de combos (em que os alunos tocam em conjunto) e as aulas individuais de instrumento. Ambas preparam para os concertos finais no Pequeno Auditório do CCB, com os quais a LJSS encerra todos os anos a sua actividade.
E, claro, as Masterclasses. A que tivemos oportunidade de acompanhar revelou-se muito interessante pois o saxofonista indiano Rudresh Mahanthappa partilhou com a audiência as músicas que mudaram a sua vida, alargando os seus horizontes ao trazer à LJSS a cultura musical indiana.
Last but not least, há ainda mais três componentes de sucesso que marcam a LJSS. A primeira é a organização e divulgação que João Godinho e Alexandra Ávila lhe imprimiram desde o início, eles que são de facto os seus ideólogos.
A segunda são as jam-sessions que têm lugar todas as noites e que misturam os alunos de ambos os cursos e os próprios professores, que não se fazem rogados em tocar sequer com músicos iniciados ou de nível intermédio.
A terceira é a informalidade que reina na LJSS, essencial para garantir o diálogo entre quem aprende e quem ensina.
Porquê o CCB?
Talvez se pergunte por que razão é o CCB, e não a Escola Superior de Música, a apostar na formação… A verdade é que faz todo o sentido este envolvimento pois é interessante e importante (muito) ver uma sala de espectáculos a trabalhar a montante, isto é, a contribuir para a formação daqueles que virão um dia a ser os seus fornecedores (os músicos) e também os seus clientes (os muitos jovens que além de músicos serão também público). Este é um dos grandes méritos da LJSS e talvez, porém, o que passa mais invisível ao imediatismo que oferece o propósito mais explícito da formação em si.
Quem durante anos criticou o Estado e as suas instituições por só fomentar a oferta e não a procura tem aqui na LJSS um exemplo de uma excepção que urge democratizar pelo país e que importa alargar ainda mais também ao público em geral.
Caminhos para o futuro...
No futuro é crucial envolver também melómanos e apreciadores de Jazz em particular - assim como os muitos que desconhecem o Jazz e a sua magia e que assim poderiam entrar nele - para os quais a LJSS pode, e deve, igualmente criar programas. É sabido que o maior inimigo de algo é o preconceito e a ignorância, dois obstáculos que poderão desta forma ser combatidos. Far-se-ia, assim, a triangulação “perfeita” ao formarem-se músicos, estudantes de música e público.
Esses programas podem incluir aulas de história do jazz no mundo e em Portugal pois um músico não pode apenas saber o idioma, tem também de conhecer a sua idiossincrasia e contexto cultural, político e social. E no caso concreto do jazz, é importante que ele não seja ensinado sem que quem o aprende perceba o que ele representou para um povo que em pleno século XX ainda vivia segregado, discriminado e relegado aos trabalhos manuais. Retirar-lhe esta informação e dimensão é fazer do Jazz apenas um género musical, o que o empobrece sobremaneira.
Finalmente, tais programas podem também incluir vertentes que só recentemente foram introduzidas em Portugal quando em Junho do corrente ano a Associação Grémio das Músicas e a Universidade do Algarve promoveram uma master class sobre comunicação e marketing para bandas. São estas competências que o carácter inovador da LJSS precisa agora acrescentar ao seu programa, no que pode ser pioneira a nível internacional…
No demais, no ensino da música, a LJSS atingiu uma excelência que os músicos, melhor do que ninguém, atestam. Ricardo Toscano, por exemplo, afirmou-nos em entrevista o seguinte:
"Foi uma oportunidade única e fantástica poder conviver e trabalhar com pessoas e músicos daquele nível e deram-nos tanta informação e tantas maneiras de a usar... Foi de longe o melhor workshop em que algumas vez participei. Foi uma grande experiência de vida".
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