2 de outubro de 2009

João e Laginha: Quintessência em Belém

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Foto de Vítor Matos.

Assistimos ontem a um memorável concerto de Maria João e Mário Laginha no Palácio de Belém, espectáculo integrado nas celebrações do 5º aniversário do Museu da Presidência da República. Memorável porque ontem, mais do que nunca (e este nunca refere-se a muitas vezes) ficou patente que João e Laginha se encontram verdadeiramente no auge do seu talento e criatividade.

No Dia da Música, o duo trouxe para o palco o seu melhor e apresentou um espectáculo irrepreensível e de notória qualidade internacional; um espectáculo em que houve muita magia e que representa o expoente da música portuguesa e reinterpreta na actualidade a fusão de culturas que se produziu com os Descobrimentos.

Laginha realizou solos notáveis (especialmente em "Cair do Céu") e providenciou a fundação harmónica e rítmica para o canto maduro, original, tocante, vibrante e evocador de Maria João. Os seus solos foram de uma clara inspiração o que, aliado à sua técnica e capacidade vocal, deixou a audiência rendida.

No conjunto, a sua música foi sempre interessante porque reiventada em cima do palco, mesmo no clássico "Beatriz", o que não é tarefa fácil face às incontáveis vezes em que João e Laginha já interpretaram este tema.

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Foto de Vítor Matos.

Se necessário fosse, este concerto reforçou a certeza que já tínhamos de que Maria João e Mário Laginha são um caso de excepção na música a nível mundial. E reforçou também a certeza de que há que agradecer a João e Laginha por terem ousado criar a sua própria música, mesmo quando as vozes mais conservadoras do jazz eram críticas e surdas à sua originalidade.

É, pois, tempo do poder político ajudar a internacionalizar ainda mais estes dois músicos de excepção. E se pruridos houver de que "isto é jazz e não música portuguesa", perceba-se que "isto" é - além de música de um extraordinário nível - uma verdadeira expressão do Portugal que descobriu mundos e soube receber em si parte das suas culturas. A música de João e Laginha tem Portugal, África e o Brasil impregnados no seu mais íntimo ritmo e sentir e é o jazz português na sua essência mais pura, aquela que não pode ser decalcada sem a presença de um pouco da alma e das gentes deste país.

A próxima geração julgará até que ponto soubemos valorizar estes dois artistas e assumi-los, ou não, como algo intrinsecamente nosso e digno de orgulho. Nesse sentido, o Palácio de Belém deu aqui um contributo essencial para a sua definitiva institucionalização na música portuguesa da contemporaneidade, chame-se lhe jazz ou apenas música improvisada. A verdade é que os nomes de João e Laginha procederão sempre qualquer rótulo que se lhes queira apôr, servindo eles mesmos de marca de distinção e cartão de apresentação.

O próximo passo deveria ser a criação de condições para que esta dupla possa criar e compôr, acrescentando assim valor ao nosso património cultural e musical. Referimo-nos a bolsas de criação, encomendas e, porque não, a uma espécie de residência artística num espaço cultural privilegiado do país e a digressões pelos PALOP e não só. A matéria prima já existe; falta apenas saber melhor o que fazer com ela em matéria de política cultural e de afirmação da língua portuguesa no mundo.

JNPDI agradece a Vitor Matos pela gentil cedência das duas fotografias que publicamos com este post.


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