17 de abril de 2004

I had a dream...

Um dia acordava e o jazz estava nas escolas de todo este imenso Portugal.

Servia para aproximar raças e religiões porque, como idioma universal e popular, permite todas as abordagens, estilos, aproximações, discursos. Não discrimina.

Os alunos excluídos e mais carenciados, mesmo não sabendo tocar, faziam percussão (sons da rua, da sua rua) e aprendiam que na sociedade todos podem falar desde que não se atropelem. Assim é o jazz, todos podem solar desde que saibam onde começar e onde terminar.

Brancos e pretos unidos pela música; ninguém rejeitado à partida. Um lugar ao sol(ista) para todos. Uma música para ir ao fundo da alma, ao encontro de cada um. Uma música que, ao contrário do pimba e do sol e dó, faça pensar, reflectir, deixe algo mais do que efémeras melodias inconsequentes.

O problema desta sociedade é não nos ouvirmos nem ouvirmos os outros. É partirmos de nós para chegar aos outros em vez de partir dos outros para chegar a eles.

Falta harmonia porque só há solistas, isto é, individualismo. E o jazz (ou a vida/sociedade) precisam de ambos; muito espírito de nação.

Portugal mais parece 10 milhões de portugueses e um país. Cada um a tentar desenrascar-se por si, a arranjar esquemas, quintas, capelas e capelinhas. No Estado erguem-se verdadeiras muralhas Fernandinas em torno de cada direcção-geral, ministério, comissão, instituto. A dificuldade não é, então, fazer, é simplesmente comunicar; penetrar na muralha acirradamente defendida por cada líder tribal...

Aliás, se os Descobrimentos fossem hoje, Vasco da Gama não passava de Cacilhas. Havia de faltar o visto do Tribunal de Contas, haveria vagas por preencher na tripulação do navio, não haveria dinheiro para as velas, a «Caras» quereria o exclusivo das fotos na primeira praia a ser avistada, a TVI haveria de chegar à Índia primeiro, tirando-lhe o protagonismo, Santana Lopes teria de baptizar o navio, Paulo Portas quereria passar a tripulação em revista... e Durão haveria de pôr-se em bicos de pés para ficar na fotografia. Cavaco Silva desmentiria que seria Presidente quando o navio voltasse quatro anos depois, Guterres não haveria de piar, Ferro, qual âncora presa no leito da corrente, haveria de enferrujar antes de largar a nau do PS.

Descobriríamos então todos que antes de partirmos à conquista de novos mundos teríamos de organizar o nosso próprio mundo. Rasgar Portugal de alto a baixo, cortar feudos, afastar caciques, expulsar os medíocres, chutar os corruptos, rachar o betão em que nos prenderam, educar e aprender, saber para ensinar, limpar rios e riachos mais os que proclamam a defesa do ambiente e logo subscrevem a instalação de novas fontes de poluição, expôr na praça pública os vendilhões do templo, arrolar em pergaminhos eternos os que venderam a alma deles e dos outros, publicitar alto e bom som que o país vai nu!


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