Quando a esmola é demais...
O Portugal do jazz parece viver alheado da crise profunda em que o Portugal dos portugueses comuns mergulhou desde o célebre discurso da tanga
Multiplicam-se festivais que povoam o país como cogumelos (o que é bom), as autarquias investem no jazz (resta saber com que fundos e se também investem na formação de músicos, seja de que idioma musical se trate...), os discos vendem como nunca e até a Adriana Calcanhoto e o Camané se juntam à caravana e actuam em festivais cool.
Mas quando a esmola é demais o pobre desconfia e fica de pé atrás...
Toda esta jazzosequizofrenia está bem visível e vem agora aqui a propósito do festival de Angra, nos Açores.
Pela primeira vez, tanto quanto «Jazz No País do Improviso!» sabe, um festival nacional de jazz comprou publicidade nesta revista. Resta saber com que benefícios e com que orçamento (público?).
É que não é preciso ser estratega de marketing para perceber que a relação custo benefício desta operação de propaganda é altamente duvidosa. Não só é pouco provável que os leitores americanos ou europeus desta revista venham ouvir jazz aos Açores (com custos de deslocação e estadia, etc), como é também pouco provável que os assinantes/leitores portugueses da «Downbeat» ultrapassem uma escassa centena, isto a avaliar pelos poucos exemplares (4/5) que se encontram nas principais lojas de imprensa.
«Jazz no País do Improviso!» confessa que nunca foi aos Açores (tem pena), não conhece o «Angra Jazz» (tem pena) e pode estar aqui a cometer algum erro grosseiro, mas a verdade é que pelo lado da lógica não se encontra razão aparente para tal publicidade.
Significa isto que não devemos promover o que é nosso? Não, antes pelo contrário. Devemos, sim, promovê-lo nos canais adequados em função do público-alvo de cada evento e da capacidade desse canal chegar ao mesmo com boa relação custo benefício.
Usando uma analogia muito simples: colocar na «Downbeat» um anúncio de um festivasl de jazz em Angra é como colocar na televisão nacional (RTP, SIC, TVI) um anúncio de um Ferrari. São mais os espectadores que ficam a ver navios (9 999 900 milhões) do que os que o podem vir um dia a conduzir.
«Jazz no País do Improviso!», já se sabe, é por natureza crítico e exigente e quando critica fá-lo porque quer melhorar e não destruir. Somos pelo jazz e não contra o jazz.
Neste caso a mensagem que pretendemos passar é que os nossos festivais de jazz precisam de melhorar o seu marketing. É que muitos dos produtores dos nossos festivais continuam a não saber explorar o direct mailing (ou e-mailing), a desconhecer as características da sua audiência e os motivos por que o público opta por um determinado concerto e não por outro, a não comunicar com o seu público, a não conseguir promoção suficiente nos media nem ter com estes uma relação proactiva/profissional, a descurar o poder promocional e de notoriedade que poderia obter dos músicos que contrata, etc... Neste etc. inclui-se, e pasme-se, a inexplicável inexistência por vezes de um simples programa do concerto, como constatámos no caso da orquestra de Count Basie, que recentemente actuou no CCB. Muita da informação que surge nos media, nomeadamente as entrevistas com os músicos (raras), surge mais por iniciativa dos jornalistas do que por acção dos produtores ou das editoras, que também podiam e deviam (e já tiveram) aqui um papel fundamental.
É por aqui, pelos alicerces e pelas ferramentas mais básicas, que tem de se começar a construir a casa, sem queimar etapas. Depois, então, veremos se a «Downbeat» faz ou não sentido, com que sentido, com que envolvimento do ICEP, se através da publicidade tradicional ou de uma publireportagem que envolva também a promoção turística da região (neste caso os Açores) e a venda de um pacote festival + turismo numa região de inegável beleza.
Por outro lado, a crescente emergência de festivais levanta mais uma vez a necessidade de entendimento entre produtores, para exploração de sinergias e exclusão da sobreposição de datas. Já aqui tratámos deste tópico em que mais uma vez insistimos. Essa cooperação permitiria dividir os custos fixos e assegurar uma programação ao longo do ano. Um bom exemplo da mesma é a parceria entre o Guimarães Jazz e a Culturgest.
Vamos a isso!
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